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segunda-feira, 15 de dezembro de 2025
O RIO BRANCO
Acre

ARTIGO: O PODER INVISÍVEL: A ENGENHARIA OCULTA DO ESTADO EM EXAUSTÃO

Publicado em 09/12/2025

Eliton Muniz

Uma leitura para quem enxerga estrutura onde outros veem espuma.

Há um erro de percepção que atravessa o Brasil como uma febre mal diagnosticada:
os três poderes parecem disputar espaço, mas o que realmente está sendo contestado é a própria ideia de autoridade.
A disputa não é entre Executivo, Legislativo e Judiciário — é entre o Estado e aquilo que tenta devorá-lo por dentro.

E esse “aquilo” tem nome: o Poder Invisível.
Não está na Constituição, não fez concurso, não prestou juramento.
Mas pauta, pressiona, humilha e molda o país como se sempre tivesse existido.

I — O Brasil entrou na era da política sem chão

A ideia clássica de poder — a força que se impõe pela legitimidade — colapsou.
O que temos agora é outra coisa: poder que se impõe pela atenção.
Uma autoridade líquida, instantânea, que dura o exato tempo de um viral, de um corte, de um trending topic.

Os três poderes tentam se afirmar, mas todos sabem a verdade incômoda:
nenhum deles controla mais o imaginário nacional.

É aqui que a análise exige coragem.

II — A morte lenta das instituições começa quando o povo começa a achar que pode substituí-las

A multidão não quer mais representação: quer espelho.
Não busca mediação: busca confirmação.
Não respeita processos: exige atalhos.

O Poder Invisível nasce exatamente dessa fusão tóxica entre emoção coletiva, lógica algorítmica e líderes que performam mais do que governam.

O Brasil vive um paradoxo sinistro:
o povo quer ordem, mas idolatra o caos.

III — A tríplice disputa perdeu o sentido: agora é um ritual para entreter a própria desordem

Executivo, Legislativo e Judiciário não são mais protagonistas — são personagens.
Têm falas, cenários, tensões, reviravoltas…
mas já não escrevem o roteiro.

O dramaturgo está fora do palco.
É o Poder Invisível.

Esse poder não tem rosto, mas tem fome.
Não tem corpo, mas tem impacto.
Não tem origem, mas tem destino:
a captura simbólica do Estado.

E por isso o país parece enlouquecer.
Quando quem governa não sabe quem manda, governa-se no escuro.

IV — A profecia que ninguém ousou formular: o Brasil caminha para um “Estado anfíbio”

Nem institucional, nem popular.
Nem republicano, nem tribal.
Nem racional, nem afetivo.

Um híbrido.
Um organismo que respira pela boca da emoção e se movimenta pelo impulso do algoritmo.

A Constituição vira cenário.
As leis, adereços.
O governo, performance.
A oposição, merchandising.
O voto, uma gigantesca pesquisa de opinião.

E no centro disso, o Poder Invisível opera como um buraco negro moral:
atrai tudo, distorce tudo, ilumina nada.

V — O que vem depois do colapso da autoridade?

Não é golpe.
Não é revolução.
Não é ruptura visível.

É algo mais silencioso — portanto, mais perigoso:
o Brasil começa a aceitar que verdades são relativas, leis são opcionais e instituições são descartáveis.

Quando isso acontece, não é o país que muda.
É o país que derrete.

E nesse derretimento, surge sempre alguém dizendo:
“Deixem comigo. Eu resolvo.”

O nome muda a cada era.
O mecanismo, nunca.

VI — A pergunta que ecoa no vazio

Quem é que o Brasil está autorizando — sem perceber — a governar no lugar dos três poderes?

O Poder Invisível.
A entidade sem rosto.
A multidão sem responsabilidade.
O algoritmo sem moral.
A narrativa sem compromisso com o real.

É esse o governante que estamos criando.
Um governante que não responde por seus erros e não assume suas escolhas.
Um governante que não cai, porque nunca subiu.
Aquele que não morre, porque nunca nasceu.

VII — A síntese final: o Brasil não está em crise política — está em crise ontológica

O país não sabe mais o que é.
Não sabe mais quem fala por ele.
Não sabe mais qual autoridade merece respeito.

E quando um país perde o seu eixo ontológico, ele não quebra.
Ele se perde.

O Brasil não está sendo disputado por três poderes.
Está sendo consumido por um quarto.

E esse quarto poder, justamente por ser invisível, é o único que ninguém consegue derrotar.

Porque para derrotá-lo seria preciso fazer o que o país desaprendeu:
reconhecer a realidade, aceitar limites, cultivar a dúvida, abandonar a idolatria do instante.

Enquanto isso não acontecer, continuaremos assistindo ao mesmo teatro:

Poderes que parecem governar.
Pessoas que parecem escolher.
Narrativas que parecem explicar.

E uma força oculta que realmente decide.

O nome dessa força, agora revelado, é o que faltava para completar o quadro:
o Poder Invisível — o verdadeiro soberano da era da hiperatenção.

Assinatura

Por Eliton Muniz — Cidade AC | News
Um redator amador do Acre, desses que escrevem no silêncio porque enxergam no escuro.
Não tenho título acadêmico para explicar o Brasil, mas tenho uma coisa que anda rara:
a coragem de olhar para o que ninguém quer ver e dizer o que ninguém quer dizer.
Se erro, erro tentando entender.
Se acerto, é porque a realidade, às vezes, cochicha para quem está longe dos holofotes.

Escrevo daqui — da borda do mapa — onde o Brasil parece pequeno, mas onde a visão, curiosamente, fica maior.
O centro do país discute o barulho.
Eu só tento decodificar o que está por trás dele.

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