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terça-feira, 25 de novembro de 2025
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Dois meses depois de instalada, CPMI do INSS mostra rumo preocupante

Comissão teve muito barulho, pouco resultado, governistas travando investigações e, se continuar assim, caminha para o fiasco

-Por Ricardo Chapola – Publicado em (VEJA)

Quando a Polícia Federal começou a bater à porta de uma dezena de entidades
suspeitas de terem desviado bilhões de reais dos aposentados do INSS, não
restava dúvida de que o país estava diante de mais um monumental escândalo
de corrupção — maior que o mensalão, o esquema descoberto no primeiro
governo Lula, e comparável em sua dimensão ao petrolão, o assalto aos cofres
da Petrobras revelado no governo Dilma Rousseff. Essa inédita modalidade de
crime incluiu a crueldade como arma. As vítimas eram idosos, muitos deles
doentes, com dificuldades cognitivas ou analfabetos, que foram enganados ou
induzidos por espertalhões a autorizar descontos em suas já minguadas
pensões. O Congresso criou uma Comissão Parlamentar Mista de Inquérito
para investigar o caso. Dois meses depois de instalada, no entanto, até agora
ela não conseguiu avançar um milímetro sequer na direção do que interessa.
Disputas políticas, vaidades, interesses nem sempre legítimos e conveniências
têm dificultado e até mesmo impedido a apuração de certos episódios. A
continuar assim, a CPMI corre o risco de terminar num retumbante fiasco.

A investigação da polícia revelou em abril passado que associações e sindicatos
se uniram a lobistas e montaram uma quadrilha que descontou ilegalmente
cerca de 4 bilhões de reais das aposentadorias dos idosos. A engrenagem
funcionou durante seis anos e era movida a pagamento de propinas. Os
recursos roubados entravam na conta das entidades, eram transferidos a
empresas criadas para lavar o dinheiro e, somente depois, suspeita-se, chegava
ao bolso dos beneficiários finais. A CPMI terá grande valia se conseguir
iluminar essa última etapa do processo. Pistas não faltam. Relatórios do
Conselho de Controle de Atividades Financeiras (Coaf) já revelaram
pagamentos milionários e, ao mesmo tempo, estranhos a bancas de advocacia
e a determinadas pessoas por serviços não explicados. A comissão tem poderes
para quebrar os sigilos dos suspeitos, pode convocá-los a depor e realizar
diligências em busca de esclarecimentos sem as limitações de uma apuração
convencional. Algumas bancadas, porém, têm se empenhado em evitar que
isso aconteça.

Há três semanas, por exemplo, VEJA revelou um episódio que merecia uma
investigação aprofundada. O advogado Paulo Boudens, um conhecido e bem
relacionado funcionário do Senado, recebeu 3 milhões de reais de uma das
empresas investigadas pela polícia. O mínimo que se esperava é que ele fosse
instado a se explicar, o que sequer aconteceu. Ao contrário. Os parlamentares
da bancada governista, que são maioria na comissão, rejeitaram o pedido para
quebrar o sigilo do advogado e descartaram a possibilidade de intimá-lo a
depor — uma incompreensível falta de curiosidade para quem exerce a função
de investigador. Nos bastidores, especula-se que essa inapetência teria a ver
com o fato de Boudens ser homem de confiança do presidente do Senado, Davi
Alcolumbre. Os governistas também atuaram para evitar o depoimento de um
empresário que havia se colocado à disposição para falar sobre as conexões
políticas do esquema e também já haviam avisado que seriam rejeitados os
requerimentos de convocação de José Ferreira da Silva, o Frei Chico, irmão do
presidente Lula.

Frei Chico é vice-presidente do Sindicato Nacional dos Aposentados,
Pensionistas e Idosos (Sindnapi), uma das entidades suspeitas de participação
no desvio das aposentadorias. Na terça-feira 14, o ministro André Mendonça,
do Supremo Tribunal Federal, determinou o sequestro dos bens da entidade e
de seus dirigentes. O irmão do presidente não é formalmente investigado e
nem foi alvo da operação. A oposição, por sua vez, diz ter uma imensa
curiosidade de saber, entre outras coisas, se, como dirigente, ele teve
conhecimento ou participação na operação do esquema de descontos que
rendeu 389 milhões de reais ao sindicato nos últimos cinco anos,
especialmente a partir de 2023, depois da ascensão de Lula ao governo. Na
quinta-feira 16, foram colocados em votação sete requerimentos solicitando a
convocação do sindicalista — todos, como previsto, rejeitados. “Esse empenho
dos governistas em proteger o irmão do presidente é a maior prova de que há
algo de muito grave escondido nessa relação entre ele e esse sindicato”, diz o
deputado federal Marcel van Hattem (Novo-RS). “Aqui não é delegacia de
polícia nem palco para espetáculo midiático”, rebate o deputado Paulo Pimenta
(PT-RS). “Frei Chico é um exemplo de brasileiro”, acrescentou. Enquanto isso,
a investigação segue patinando.

A CPMI já ouviu treze depoimentos, quebrou os sigilos de 230 pessoas físicas
e jurídicas e reuniu mais de 200 gigabytes de documentos. Apesar da falta de
avanços, a cúpula do colegiado avalia que o saldo dos primeiros dois meses de
trabalho é positivo. “Quem achar que essa CPMI será palco de espetáculo, vai
se frustrar. Vamos apontar nomes, conexões e beneficiários finais do
esquema”, promete o senador Carlos Viana (Podemos-MG), presidente da
comissão. Para o deputado Alfredo Gaspar (União Brasil-AL), relator, os
habeas corpus concedidos pelo Supremo Tribunal Federal, que garantiram o
direito ao silêncio aos depoentes, e a blindagem política de personagens
centrais da trama são obstáculos que serão superados a partir de novas
estratégias de apuração que estão sendo traçadas. “Os bandidos de estimação
de alguns serão desmascarados”, diz o parlamentar. Pode ser. Mas o histórico
dos últimos dois meses não dá margem a muito otimismo.

 

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