O Ministério Público Federal (MPF) promoveu, na manhã de sexta-feira (28), uma audiência pública em Rio Branco para discutir ações — e omissões — do poder público quanto à proteção e à regulamentação do uso sacramental da ayahuasca por grupos religiosos tradicionais.
Conduzido pelos procuradores da República Lucas Costa Almeida Dias e Luidgi Merlo Paiva dos Santos, o encontro reuniu mais de duzentas pessoas, tanto no auditório do MPF quanto de forma virtual. Entre os participantes estavam lideranças religiosas, povos indígenas, representantes de movimentos ayahuasqueiros, órgãos ambientais e de segurança pública, gestores das três esferas de governo, pesquisadores e membros da sociedade civil.
Debate sobre proteção e segurança cultural
Na abertura, os procuradores ressaltaram que o objetivo central da audiência era “dar voz às comunidades indígenas e tradicionais ayahuasqueiras” e coletar subsídios técnicos, jurídicos e culturais para reforçar a atuação institucional em defesa do uso ritual da bebida.
Segundo o MPF, relatos recorrentes de fiscalizações consideradas arbitrárias, apreensão indevida de materiais ritualísticos e dificuldades para o transporte e a coleta das plantas utilizadas no preparo da ayahuasca motivaram o debate. Outro ponto de preocupação é o atraso considerado excessivo no processo conduzido pelo Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (Iphan), que analisa há mais de 15 anos o reconhecimento da ayahuasca como patrimônio cultural imaterial.
Demandas apresentadas
Durante a audiência, representantes de diferentes tradições — desde centros urbanos até comunidades amazônicas e povos indígenas — denunciaram a falta de regulamentação clara, o receio de perseguição institucional e a ausência de protocolos oficiais para orientar as forças de segurança. Também demonstraram preocupação com a preservação dos territórios onde são coletadas as plantas sagradas.
Lideranças indígenas reforçaram que o uso da ayahuasca é ancestral, associado à cura, espiritualidade e organização social, e pediram que o Estado reconheça as especificidades culturais e cosmológicas envolvidas no ritual.
Encaminhamentos
Ao final, o MPF informou que consolidará todas as contribuições em um relatório oficial, que trará:
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recomendações a órgãos das áreas de segurança, cultura, meio ambiente e saúde;
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propostas para uniformização de condutas;
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criação de protocolos de transporte, coleta e armazenamento das plantas utilizadas no preparo da ayahuasca.
O órgão também sugeriu ampliar espaços permanentes de diálogo entre comunidades tradicionais e o poder público, além de acompanhar mais de perto o processo do Iphan, solicitando aceleração das etapas pendentes.
Novas reuniões técnicas poderão ser convocadas com base no material reunido. O relatório final será divulgado nas próximas semanas e servirá como base para futuras ações institucionais do MPF.

