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quarta-feira, 26 de novembro de 2025
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Disputas de poder geram atritos entre presidentes do Senado e da Câmara

ALIANÇA - Lula e Davi Alcolumbre: combinação de estratégias para barrar pautas da oposição (Ton Molina/Fotoarena/.)

A dupla Motta e Alcolumbre começou a desafinar em meio às pressões da ala bolsonarista no Congresso. Nada indica vida fácil daqui em diante

Por Marcela Mattos da (VEJA)

Foram meses à espera do melhor momento para viabilizar um dos mais
infelizes projetos legislativos dos últimos tempos. Na semana passada, a
Câmara aprovou a chamada PEC da Blindagem, uma emenda constitucional
que dava ao Congresso a prerrogativa de autorizar ou não a instauração de
processos judiciais contra os parlamentares e impedia prisões de deputados e
senadores, salvo em flagrante e por um delito inafiançável. A proposta foi
aprovada por uma ampla maioria de votos após um acordo entre o Centrão e a
bancada de direita. Enquanto os deputados comemoravam a aprovação da
insólita PEC e se preparavam para avançar sobre o projeto da anistia, a
segunda etapa do acordo, o presidente do Senado fez um desabafo do outro
lado do Congresso. Da tribuna, Davi Alcolumbre (União Brasil-AP) lamentou
as obstruções impostas por aqueles que defendem temas como o
impeachment de ministros do Supremo e o perdão aos condenados pelos
ataques do 8 de Janeiro, dizendo que o comportamento atrapalha o
andamento dos projetos de interesse do país. “Todos os dias, de manhã, de
tarde e de noite, aparece alguém com alguma ideia, criando algum transtorno,
agredindo e ofendendo alguém.” E concluiu: “A gente está sendo atropelado e
dragado por uma mesma conversa desde a última eleição”.

Horas depois, o plenário da Câmara deu de ombros às declarações e, sob a
batuta do presidente Hugo Motta (Republicanos-PB), aprovou a urgência do
texto que prometia uma salvaguarda aos envolvidos nos atos golpistas. A
medida é uma das principais bandeiras dos parlamentares de oposição —
aqueles mesmos que, num gesto de total desrespeito às instituições,
organizaram um motim no mês passado e chegaram a impedir Motta de
ocupar a própria cadeira. Pressionado na Câmara, o deputado foi alvo das
manifestações que levaram milhares de pessoas às ruas no domingo 21, para
protestar contra a agenda do Congresso. Os gritos de “Fora, Hugo Motta”
foram entoados inclusive no reduto político do paraibano. Alcolumbre, por sua
vez, saiu ileso dos protestos. Na sequência, a Comissão de Constituição e
Justiça (CCJ) do Senado arquivou a PEC da Blindagem.

AMIGOS - Motta: apoio de Lira foi fundamental para a ascensão do deputado (Gabriela Biló/Folhapress/.)

Eleitos em fevereiro deste ano, Motta e Alcolumbre traçaram caminhos
comuns para chegar às duas das mais poderosas cadeiras da República. Ambos
conversaram com o presidente Lula, pediram a bênção também ao ex–
presidente Jair Bolsonaro e distribuíram promessas de que todos,
independentemente da coloração partidária, seriam ouvidos em suas gestões.
A habilidade em contemplar grupos e interesses tão distintos seria obtida a
partir da moderação, dando fim à belicosa relação mantida entre os
antecessores Arthur Lira (PP-AL) e Rodrigo Pacheco (PSD-MG), que nem
sequer se falavam. Consta até que o tradicional portão interno que separa as
duas residências oficiais em Brasília, mantido trancado na gestão anterior, foi
reaberto.

Dando mostras da parceria, Motta e Alcolumbre derrubaram o decreto do
governo que aumentava o imposto sobre operações financeiras (IOF) e, por
outro lado, fizeram gestos ao Planalto após as sanções financeiras impostas
pelos Estados Unidos — a política do equilíbrio. A dupla, porém, começou a
desafinar em meio às pressões da ala bolsonarista no Congresso. Enquanto o
comandante do Senado sempre rechaçou qualquer possibilidade de anistia,
alinhado com o Palácio do Planalto, seu colega na Câmara sinalizava que
algum tipo de perdão poderia ser concedido — um dos supostos compromissos
que o deputado teria assumido na campanha.

CONSTRANGIMENTO – CPMI: parlamentares querem convocar homem de confiança do presidente do Senado para depor (Lula Marques/Agência Brasil)

Ao pagar a fatura à oposição, particularmente aos bolsonaristas, Motta
também atendeu seus colegas do Centrão e embutiu a PEC da Blindagem no
pacote — uma forma de agradar aos dois grupos. O texto obteve o aval de 353
deputados, mas, em meio à pressão popular, acabou rejeitado uma semana
depois de aprovado na Câmara. Figuras próximas a Hugo Motta não
esconderam a irritação com o desfecho. Garantem que o pacote estava
devidamente negociado com o Senado. “O Davi sacaneou o Hugo. Estava tudo
acordado”, diz um deputado do União Brasil. “Se o Senado não teve coragem, é
outra coisa”, completa um outro aliado do presidente da Câmara. Há também a
desconfiança de que o parlamentar esteja sendo alvo de uma campanha com o
objetivo de fragilizá-lo. Para muitos congressistas, a autoridade de Motta vem
sendo corroída rapidamente, semana após semana, a ponto de alguns
detratores o chamarem de “ex-presidente da Câmara em exercício”. Motta
precisa virar o jogo, pois tem projetos claros no horizonte que dependem de
seu prestígio e poder político. Ele tem planos de alçar o pai, atual prefeito de
Patos (PB), a uma cadeira de senador com o apoio do presidente Lula e
também mira a reeleição para o comando da Câmara.

Passado o turbilhão do fim de semana, Motta retomou sua estratégia de tentar
compor com todo mundo — ou quase todo mundo. A empresários, o deputado
justificou que precisava tirar as “pautas tóxicas” do caminho e discutir projetos
relevantes para o país, como a reforma administrativa. Num aceno aos
deputados que chancelaram a PEC, defendeu a medida dizendo que ela
fortalece a atividade parlamentar. Houve afagos à esquerda com a decisão de
barrar a indicação do deputado Eduardo Bolsonaro como líder da minoria, o
que abre caminho para sua cassação. Já num gesto ao Palácio do Planalto,
prometeu pautar na próxima quarta-feira, 1º, o projeto que amplia a isenção
do imposto de renda para quem ganha até 5 000 reais.

O texto é relatado por Arthur Lira, e a disputa pela paternidade dele deve gerar
um novo capítulo de tensão com o Senado. A proposta foi encaminhada pelo
governo à Câmara em março deste ano e aprovada por uma comissão especial
em meados de julho. Depois disso, bastaria a votação em plenário, o que
acabou não acontecendo. Em meio à inércia, os senadores decidiram dar
andamento a um projeto com o mesmo conteúdo. A relatoria foi entregue a
Renan Calheiros (MDB-AL), inimigo histórico de Lira. Num ritmo bem mais
acelerado, a proposta foi aprovada pelo Senado e deve ser encaminhada à Câmara. Ainda não está definida qual versão será priorizada pelos deputados e
quem vai colher os louros de uma medida tão popular na véspera de um ano
eleitoral.

SEM ACORDO - Paulinho e Sóstenes: embate entre redução de pena e anistia geral (Pedro Ladeira/Folhapress/.)

Virar a “pauta tóxica” não será uma missão muito simples. O Congresso
continua travado pelo impasse da concessão de anistia aos envolvidos nos
ataques golpistas. O deputado Paulinho da Força (Solidariedade-SP) foi
indicado por Hugo Motta para elaborar a versão final do projeto. De antemão,
ele rejeitou conceder um perdão total aos envolvidos. O objetivo agora é
reduzir as penas de alguns dos crimes imputados aos condenados. Em busca
de consenso, o deputado conversou com lideranças dos principais partidos,
pediu conselhos ao ex-presidente Michel Temer e consultou ministros do STF.
“Não dá para agradar a todos, mas, se a gente conseguir fazer esse texto que
agrade à maioria, vai pacificar o Congresso, os poderes e também o Brasil”,
disse ele a VEJA. Em busca de evitar novos desencontros, o deputado já se
reuniu com Davi Alcolumbre e quer que os partidos entrem em um acordo
com as duas Casas. O PT avisou que será contrário a qualquer medida que
reduza as penas. O PL de Jair Bolsonaro insiste que só aceita anistia ampla.
“Dosimetria não é competência do Congresso Nacional. O que compete ao
Congresso é a anistia, e nós não vamos abrir mão dela”, diz o líder Sóstenes
Cavalcante após reunião com o relator.

Disputas internas e embates partidários fazem parte do cotidiano de qualquer
chefe de poder. A turbulência do momento, no entanto, impõe aos atuais
ocupantes desses cargos vários desafios adicionais. Enquanto Motta luta para
recuperar a autoridade, adversários querem colocar Alcolumbre na mira da
CMPI que investiga o roubo das aposentadorias. Conforme VEJA mostrou em
sua última edição, o homem de confiança do presidente do Senado, o advogado
Paulo Boudens, recebeu 3 milhões de reais de uma das empresas investigadas
no escândalo do INSS. Boudens era braço direito do senador até VEJA também
revelar a existência de um esquema de rachadinhas no gabinete. O assessor
assumiu a culpa, prometeu devolver o dinheiro e o caso foi encerrado. A CPMI
que apura o desvio das aposentadorias já tem em mãos a documentação e
promete mergulhar na relação de Boudens com o esquema. No início da
semana, dois deputados de oposição apresentaram requerimentos pedindo a
quebra do sigilo do ex-auxiliar do presidente do Senado e a convocação dele
para prestar esclarecimentos — uma maneira de fustigar Alcolumbre, que
segue em silêncio sobre o caso. Nada indica vida fácil daqui em diante para os
dois maiores caciques do Congresso.

 

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