Atualizada em 16/03/2025 07:44
Imagem: Engraxate trabalha no Centro do Rio Pedro Ivo/Agência O Dia
Hoje em dia, várias profissões e funções que eram comuns no passado já não são mais. Alguns empregos foram extintos e outros “respiram por aparelhos”. É o caso de sapateiros, engraxates, relojoeiros, alfaiates, entre outros profissionais. Para entender melhor como funciona a rotina dessas pessoas e quais desafios elas enfrentam, O DIA entrevistou alguns desses trabalhadores.
Joe Pereira Lima, de 63 anos, é dono de uma engraxataria na rua da Assembleia, no Centro da cidade, há 20 anos. Ele conta que seu negócio teve uma séria queda nos rendimentos desde a pandemia de covid-19.
“Está mais difícil agora. O movimento caiu 50% desde a época da covid. Muitas pessoas começaram a trabalhar em home office. Tínhamos muitos clientes que trabalhavam aqui perto”, explica.
Ele diz que sua meta agora é investir na divulgação da empresa. Ele acredita que esta é a receita para turbinar o movimento da loja.
“Vou começar a divulgar melhor agora. As donas anteriores falaram que não precisava, mas agora eu vou turbinar essa engraxataria.”
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Já Eluiz Simas, de 64 anos, trabalha como alfaiate desde 2001. Ele explica que o negócio também tem desafios, porém possui uma clientela fiel.
“O que acontece é que o mercado é muito pequeno na procura por alfaiates, mas o número de profissionais também é. Por conta disso, há um casamento razoável de oferta e demanda”.
O profissional costuma fazer roupas para clientes que possuem um poder aquisitivo maior. Em 2016, ele chegou a fazer roupas para o prefeito Eduardo Paes, que estava no fim de seu segundo mandato.
Eluiz explicou que os principais desafios de sua profissão envolvem a manutenção do cliente:
“Procuro trabalhar com seriedade e oferecer um produto de qualidade. Faço também o que chamo de Vip Service. Eu vou até os clientes, trazendo mais comodidade a eles, seja no domingo ou nos feriados. Oferecendo um bom serviço, tenho mais chances de um cliente me chamar de novo ou me indicar para alguém.”
Função do dia a dia quase extinta
Além desses profissionais, há existem figuras cada vez menos presentes no nosso dia a dia. Um grande exemplo disso são os cobradores de ônibus, já que muitas empresas aboliram a função e atribuíram ao motorista a tarefa de cobrar o valor dos passageiros.
A Viação Pendotiba, que opera linhas em Niterói e linhas intermunicipais (Niterói-Rio), ainda trabalha com cobradores. A empresa forneceu informações sobre seu quadro de funcionários e mostrou a diferença do número de contratados nas duas funções.
“Entendemos ser importante a manutenção de postos de trabalhos dos colaboradores, de acordo com as necessidades, onde empregamos em torno de 60 cobradores e 330 motoristas”, diz a empresa por meio de nota.
Das quase 20 linhas operadas pela empresa, apenas três têm a função: Oceânica 1, 2 e 3.
“Nestas linhas operamos com veículos BHLS (Bus with High Level of Service) de tipologia diferente dos veículos convencionais, além de possuírem portas de embarque e desembarque nos dois lados dos veículos, que impedem a utilização tão somente do motorista”, esclarece a empresa.
Busca pelo lucro tira espaço de profissionais
O sociólogo e cientista político pela UFRJ Rafael Mello analisa as duas situações, tanto a de profissionais como o alfaiate e o engraxate, quanto a dos cobradores de ônibus.
“A tecnologia não é ‘vilã’, mas seu uso reflete as prioridades do sistema econômico. Automatizar funções como a de cobrador reduz custos para empresas, mas ignora o impacto social: trabalhadores perdem empregos sem rede de proteção. E a responsabilidade por serviços (como segurança ou atendimento) é transferida para passageiros ou motoristas sobrecarregados. Historicamente, máquinas no campo, durante a Revolução Industrial, também substituíram mão de obra, gerando êxodo rural e precarização”, compara.
Já sobre os demais profissionais, cada vez menos vistos, Rafael aponta que “a substituição de profissões é comum na história”. “Oficinas artesanais deram lugar a fábricas, sapateiros a indústrias de calçados. O que era feito com cuidado individual virou produção em série, reduzindo o trabalho a tarefas repetitivas e substituíveis. O avanço tecnológico, porém, não precisa ser sinônimo de exclusão. Se a produtividade aumenta, por que não reduzir jornadas de trabalho e distribuir os ganhos? Em vez disso, o sistema concentra riquezas”, destaca.
Clientela
A jornalista Suzana Moura é cliente do sapateiro conhecido como “Sr. Zé”, no Centro de Niterói. Ela contou o que a faz buscar por este tipo de profissional cada vez mais raro.
“Sempre fui a favor de levar sapatos dos quais gosto muito para o conserto. Primeiro, porque quando eu faço uma compra eu nunca olho só o preço, principalmente se tratando de sapatos, que eu amo. Olho a qualidade, e um sapato de boa qualidade não é tão barato. Segundo, porque prezo pelo conforto e se o sapato une qualidade e conforto, eu vou querer que ele dure o máximo possível”, diz.
“O capitalismo nos seduz o tempo inteiro que temos que sempre ter mais e comprar mais, e se tratando de sapatos, se for de qualidade ruim, não vai durar muito e teremos que substituir em pouco tempo”, completa.
Além disso, o Sr. Zé capricha demais (risos)”, frisa. Suzana também faz questão de indicar o serviço do profissional aos amigos.
O DIA