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sábado, 19 de abril de 2025
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ANPD: desconto em remédio em troca do CPF é ‘potencialmente fictício’

Atualizada em 19/04/2025 09:00

Imagem: Fabrizio Motta/FotoArena

A ANPD (Autoridade Nacional de Proteção de Dados) entende que os
descontos concedidos em troca do CPF em farmácias são “potencialmente
fictícios”.

O órgão vê um “cenário bastante grave” na política de uso de dados dos
pacientes. A avaliação consta em uma nota técnica de fevereiro, que propôs
atuação conjunta com outros órgãos para levantar mais dados.

O que aconteceu

AANPD viu ‘fortes evidências’ de que os preços cheios dos remédios ‘não
condizem com a realidade’, permitindo ‘descontos expressivos, mas
potencialmente fictícios’. A distorção é provocada por uma tabela federal que
estabelece o preço máximo dos remédios. Essa tabela está superfaturada,
segundo o Tribunal de Contas da União. Para a ANPD, o setor farmacêutico
parece ser o único a operar dessa forma no Brasil.

Os descontos em troca do CPF ‘induzem’ o consumidor a informar seus
dados, mesmo sem ‘o necessário esclarecimento’ sobre como serão
usados, diz a ANPD. A LGPD (Lei Geral de Proteção de Dados) define que o
consumidor precisa receber informações claras sobre o que será feito com
seus dados, podendo autorizar ou não o uso deles. Mas, segundo pesquisa do
órgão, essas informações não estão sendo fornecidas.

‘Dificilmente alguém deixaria de usufruir’ dos descontos, ‘ainda que sua
privacidade e seus dados pessoais estivessem em risco’, avalia o órgão. A
ANPF destaca que não informar o CPF na farmácia resulta em “prejuízo
financeiro direto”. Por isso, mesmo que o cliente tenha concordado com o uso
dos dados -“o que não parece ser” o caso-, esse consentimento “não pode ser
considerado livre”.

As análises da ANPD foram apresentadas em nota técnica de fevereiro
deste ano. O órgão, ligado ao Ministério da Justiça, é responsável por
monitorar a proteção de dados pessoais no Brasil. No mesmo documento,
a ANPD instaurou processo de sanção e auto de infração contra a
RaiaDrogasil, maior rede de farmácias do país, por “supostamente” usar os
dados para criar perfis comportamentais dos clientes e monetizar os dados
para anunciantes.

Em 2023, reportagem do UOL mostrou evidências de que grande parte
dos descontos nas farmácias é fictícia. O fornecimento do CPF em troca
dos descontos permite que as farmácias criem bancos de dados com o
histórico de saúde dos clientes. No caso da RaiaDrogasil, os dados eram
armazenados por até 15 anos e monetizados para anunciantes, que escolhiam
o público que iria receber a propaganda digital com base no que compravam na
farmácia.

ANPD sugeriu que seja feita pesquisa mais aprofundada sobre o tema e
que órgãos do governo federal cooperem para avaliar o cenário. Entre
eles, a Anvisa e o Procon. A ANPD avaliou que os problemas encontrados
extrapolam a LGPD, mas “derivam da coleta e do tratamento de dados
pessoais, inclusive sensíveis, supostamente sem a observância dos preceitos
legais, conforme os indícios robustos apontados”.

“Mesmo que o consumidor tivesse o devido acesso a informações claras,
inequívocas e completas acerca do tratamento de seus dados pessoais, os
descontos são tão expressivos que dificilmente alguém deixaria de usufruir de
tais benefícios, ainda que sua privacidade e seus dados pessoais estivessem
em risco. Ou seja, tal consentimento não pode ser considerado livre”

ANPD, em nota técnica de fevereiro de 2025

Uso de dados é ‘bastante grave’
, diz ANPD

AANPD encontrou ‘omissões e inconsistências consideráveis’ nas
políticas de tratamento de dados da indústria farmacêutica. O órgão
pesquisou os documentos de alguns dos principais laboratórios em atuação no
país. Segundo o relatório, “de maneira geral, as informações prestadas ao
titular de dados [consumidor] são falhas e insuficientes”. Assim, não é possível
saber de que forma as informações serão usadas.

Alguns laboratórios recebem dados de pacientes e médicos em troca de
descontos aplicados na farmácia. São os chamados programas de benefício
de medicamentos, vinculados a medicamentos de marca —os de referência, os
primeiros a entrar no mercado, e os similares. Genéricos não entram. É
diferente dos descontos oferecidos diretamente pelas farmácias. Nesse caso,
os dados do cliente não ficam só na farmácia, mas também são repassados
para a indústria.

No caso de dados de pacientes, ANPD viu problemas como falta de
esclarecimento para o motivo armazenamento do histórico de compras. O
órgão encontrou ainda casos em que o laboratório diz que pode armazenar até
comprovante de renda, informações de laudos médicos e histórico de
tratamento realizados. Há ainda a possibilidade de compartilhar dados com
terceiros no exterior.

Já no caso de dados de médicos, a ANPD diz haver monitoramento do
que cada um prescreve. Os dados são usados pela indústria farmacêutica
para elaborar “estratégias de marketing” junto aos médicos, segundo o órgão,
visando promover uma determinada marca de medicamentos. Além disso, os
dados permitem “aferir a efetividade” do marketing, ou seja, se os médicos
realmente prescreveram aquela marca.

Isso gera ‘potenciais prejuízos ao consumidor’, que escolhe a marca do
remédio com base na confiança que tem no médico, avalia a ANPD. “O
paciente não detém as informações necessárias para fazer a escolha de seu
produto de forma independente”, afirma. E a recomendação de uma
determinada marca pelo médico “pode dificultar que o paciente opte por
medicamentos genéricos”.

Reportagens do UOL revelaram um esquema milionário de vigilância das prescrições médicas em farmácias. Os dados são coletados mesmo que o
paciente não informe o CPF ou não compre o produto. Basta apresentar a
prescrição no balcão que o número do registro do médico e o que ele
prescreveu são registrados em um banco de dados. A indústria farmacêutica
depois compra acesso às informações.

Só em Minas Gerais, a indústria farmacêutica gastou R$ 200 milhões com
médicos em seis anos. São viagens para congressos, pagamentos de
palestras, compra de objetos para o consultório, jantares, brindes. Minas
Gerais é o único Estado do país com uma lei que obriga a divulgação dessas
informações. Diversos outros países, como Estados Unidos, têm leis nacionais
desse tipo.

“A pesquisa preliminar acerca da política de tratamento de dados pessoais
divulgada por alguns dos maiores laboratórios farmacêuticos em atuação no
país apontou que, de maneira geral, as informações prestadas ao titular de
dados são falhas e insuficientes (…) As omissões e inconsistências são
consideráveis, o que torna o cenário bastante grave.”

“O monitoramento das prescrições é usado não somente para elaborar as
estratégias de marketing junto aos médicos, mas também para aferir a
efetividade das políticas adotadas. (…) Essas práticas tendem a influenciar a
escolha da prescrição dos medicamentos, o que fragiliza o sistema regulatório
e gera potenciais prejuízos ao consumidor.”

“Foi possível observar uma série de distorções envolvidas no mercado de
medicamentos (…) capazes de gerar prejuízos relevantes aos titulares de
dados e consumidores. Embora os problemas observados envolvam questões
que extrapolam a LGPD, é evidente que tais práticas derivam da coleta e do
tratamento de dados pessoais, inclusive sensíveis, supostamente sem a devida observância dos preceitos legais, conforme os indícios robustos
apontados.”

ANPD, em nota técnica de fevereiro de 2025

*Com informção do UOL

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